Sempre brincamos que precisamos entender profundamente o cliente para desenvolver o projeto. Quase exercemos um trabalho de psicologia. Precisamos ouvir e, sobretudo, ter olhos atentos para cada informação, para as entrelinhas. E não estamos falando somente da conversa com quem nos contrata, mas com a família inteira. Precisamos entender devagar o que cada um deseja para o seu ambiente e também para a moradia em geral, afinal eles vão morar juntos, conviver e isso é muito importante.
Também devemos perceber muito bem como vivem os moradores, se eles gostam de receber, como usam e desfrutam da casa. Os hábitos, o horário de sair e chegar em casa, onde deixam os sapatos, a bolsa, a chave… tudo isso vai ajudar a pensar na ocupação dos espaços.
Talvez eles não consigam expressar corretamente o que necessitam, então, a nossa função é entender as entrelinhas, entender expressões faciais, qual a empolgação deles em cada assunto. Por exemplo, quando a área social é o que mais brilha os olhos, provavelmente o estar e o jantar mereçam um carinho ainda mais especial. Outras pessoas já nos contaram que chegam em casa e mal passam pela sala, adoram conversar na cozinha, ler no quarto, tomar um banho relaxante… nesse caso, esses espaços carecem de mais cuidado, neste momento.
Enfim, entenda seu cliente, ele não vai falar exatamente que quer um banheiro de 3 x 3 m, mas vai confessar quais as prioridades dele dentro do ambiente. É preciso ouvir sobre quais as sensações desejadas, os materiais e as cores prediletas. A partir desse olhar, criar um briefing com o programa de necessidades daquela família. Tem cliente que vai preferir mandar um monte de fotos de referências e inspiração, em vez de escrever ou falar. Cabe a nós, arquitetos, ter sutileza e delicadeza para captar essa essência, esse DNA que a casa ou o apartamento deverão ter.
Compreender a rotina e os horários de todos ajudará a definir, por exemplo, o tamanho da cozinha e a distribuição do layout. Se o prazer é comer pertinho do fogão, uma bancada de refeições rápidas será primordial por ali. Armários abertos ou fechados? Em caso de famílias mais organizadas, ter tudo à vista facilitará e muito o dia a dia, caso contrário, ter utensílios à mostra vai aumentar ainda mais a sensação de desordem e bagunça, contribuindo para trazer uma sensação de agitação e até incômodo na cozinha.
Temos que entender o que realmente esse cliente quer, tentando captar, inclusive, as mensagens subliminares. Se ele gosta de viajar, o que mais chama atenção? É a paisagem, as cores, a música, a gastronomia, os museus? Tudo isso servirá de ponto de partida para os primeiros traços do projeto, se de uma construção nova ou de uma reforma. Se a casa tiver uma ajudante do lar, até ela pode oferecer ótimas instruções de como é o uso e o fluxo da casa. Também vale a dica de que ela cuidará da manutenção e da limpeza da casa, porque não instruí-la e muni-la do máximo de informações para garantir a estética sempre linda e bem cuidada de tudo? Isso é mais que bem-vindo.
Outro ponto importante é o valor que esse cliente quer investir no projeto. Isso é muito delicado, porque a gente trabalha falando do dinheiro de outra pessoa. Sabemos que para a criatividade o céu é o limite, podemos sugerir um piso com preço baixo ou alto, produtos com qualidade, referência de design ou simplesmente indicar algo com ótimo custo-benefício. É importante entender que somos tradutores de sonhos, o sonho é do cliente e daí que você vai concluir o briefing e tudo o que será colocado em prática no projeto. Aí eu pergunto: quem coloca preço em um sonho? Eu não coloco! Então, é importante saber que, ao apresentar o projeto, esse assunto terá de ser abordado. No fim das contas, precisamos não só entender esse cliente, como ter essa inteligência emocional, trabalhar o nosso desenvolvimento pessoal para que a gente consiga ter essa sabedoria de ouvir a pessoa e traduzir tudo que ele fala e o que traz no inconsciente. É algo que envolve muito amor pela profissão, uma sintonia que vai além dos olhos, mas vem do coração!
Pati Cillo (@paticillo_arquitetura)
Expert em tendências globais de arquitetura, sustentabilidade, design e tecnologia, acumula duas décadas de experiências em obras residenciais, comerciais e corporativas.